quinta-feira, 26 de março de 2009

Cidadania participativa a 10.000Kms de casa

Na quinta-feira passada fui a um fórum no consulado Português a convite da Dra. Graça Gonçalves Pereira, Cônsul Geral em Maputo, e com a chancela da comunidade “Star Tracker” da qual faço parte desde a minha estada em Madrid. O tema era “Cidadania participativa a 10.000Kms de casa”.

A reunião foi em jeito de tertúlia onde o organizador, após breves comentários e sugestões, assumiu o papel de moderador deixando a palavra ao sinal de um levantar de dedo. Alguns falaram mais do que outros mas não houve quem da palavra tomasse posse definitiva. No meu caso, ainda que com alguma inquietação no indicador para içar em riste, reservei-me ao silêncio mas não à escuta e consequente exercício de opinião.
Os temas abordados foram, na minha opinião, bastante pertinentes ainda que as discussões de quando em vez fugissem para outros quadrantes um pouco distantes do tema principal. No entanto, o facto de se debaterem temas relacionados com o nosso País fez, por si só, com que exercitássemos o objecto da ordem do dia.
Afinando pela frequência da Sra. Cônsul, que lançou a perspectiva do exercício da cidadania associada à preocupação e manutenção da boa imagem do país no estrangeiro, queria registar a minha modesta opinião sendo que me parece pertinente por observância de alguns comportamentos menos nobres, cá em Moçambique, que contrariam os maduros conselhos da Dra. Graça.
Poderia dar exemplos concretos para dar continuidade ao meu parecer. Alternativamente, reportar-me-ei a uma pequena experiência pessoal para não correr o risco de sair machucado pela mão dos que, seguidamente, lhes sirva a carapuça.

Há um ano e meio, em Madrid, acabava de entrar no prédio duma amiga, sito na Ortega y Gasset (umas das ruas mais famosas da capital onde têm lugar as mais luxuosas e caras lojas prêt-à-porter, situada no afidalgado e conservador bairro de Salamanca). À minha frente subia as escadas do hall de entrada uma senhora, Espanhola, que transportava com dificuldade algumas compras. Prontamente, voluntariei-me a fazer o trabalho que os mínimos da educação exigem. Ao encontrar o elevador avariado, não me restou alternativa senão perguntar à senhora qual o andar do seu apartamento. E Ganhei uma viagem ao sétimo sem saber ler nem escrever. Ao chegarmos à porta a senhora puxou da carteira para me pagar o frete, ao qual eu, raivoso, devolvi um “não” delicado com uma cara e tom hipocritamente angelical. Perguntou então se eu não era romeno, como que procurando uma justificação para a minha atitude, para ela incompreensível, mas cavalheira. Respondi negativamente e acrescentei que era Português. Seguiu-se um “Joder!” (impropério proferido por qualquer Espanhol que se preze, desde o “carretero hasta la reina”) de surpresa seguido de uma forte gargalhada como que se tivesse encontrado algum cão com asas (vulgo, Português educado). A cólera que se apoderou de mim foi amparada pelo sentido de cidadania que me persegue – desconversei educadamente, despedi-me da mesma forma e fui pregar para outra freguesia. Aos reencontros que se seguiram tive direito a distintos cumprimentos, dignos do estatuto de Português que orgulhosamente faço questão de levar para toda e qualquer parte.

No meu entender, da mesma forma que temos o privilégio (pelo menos para mim) de sermos Portugueses também carregamos às costas o fardo da conservação, ou neste caso melhoramento, da imagem do nosso rico país – não se julgue, que está apenas em jogo a nossa reputação individual. Há direitos e obrigações. Seja em Espanha, ou em qualquer outra parte do mundo. Com brancos, pretos ou amarelos.
Cá por Moçambique, como se não bastassem as sequelas da nossa História em comum, observam-se com frequência Portugueses com uma invejável taxa de prepotência e soberania, com atitudes execráveis, desde o menos nobre ao vergonhoso e puritano. Com repercussões directas e imediatas no comportamento dos Moçambicanos em relação aos próximos “tugas” que se lhe atravessem.
Exige-se respeito, muito para além da inquestionável boa educação, relativamente ao país e aos que fielmente o representam. Todas as acções têm consequências e só as boas interessam, sendo que as más não constituem, nesta matéria, exercício de cidadania.


Seguiu-se a bonança ao “Brainstorm” privado e a convite da anfitriã deixamos o consulado para continuar o convívio, agora de forma mais descontraída e com direito a repasto volante. Aproveitei para privar com variadíssimas personalidades, faltando apenas a prometida presença do produtor Galvão Teles (Fados) que se encontrava em Moçambique a rodar “o último voo do flamingo” baseado no mesmo romance de Mia Couto. Já para o fim fomos brindados com um momento musical, a solo, de violino. Assistimos com prazer num ambiente que lembrava o “cucurrucucu” do Caetano interpretado para o filme “Hable com ella”.

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