quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Com saltos, sem sobressaltos (Viagem ao Tofo -1ª Parte)



Do convívio com os meus novos amigos resultou um convite para sair de fim-de-semana. Apenas dois dias haviam passado e já estava a sair da metrópole. Partimos a meio da tarde debaixo do calor abrasador africano, em direcção a norte, e com seiscentos quilómetros pela frente.










A viagem começa mesmo dentro de Maputo, a partir da zona do Aeroporto, onde a pobreza dita o limite entre os subúrbios e a cidade. As mesmas imagens que me brindaram à chegada regressaram e pareciam não querer terminar. O reflexo do condutor para fechar o vidro do carro não foi suficientemente rápido para evitar a lufada de ar fétido que anunciava a passagem pela lixeira “municipal”. Nem mesmo com o vidro fechado. A imundice estendia-se por vários hectares e parte dela beirava com a estrada. No entanto as pessoas não aparentavam ter qualquer problema de convívio com esta realidade. Pateavam o passeio, que não existe, limitado pelo muro da lixeira e o alcatrão da nacional nº1, como se fossem imunes à terrível fragrância. Do outro lado da estrada corria um cordão comercial onde, indiferentes à outra margem, tudo se vendia (comida inclusive). Seguiram-se milhares de palhotas que abraçam a cidade e se estendiam duas dezenas de quilómetros, in decrescendo, até serem engolidas pela impiedosa vegetação.







Passada uma hora de viagem, uma acácia erguida no meio do nada anunciava a entrada na savana africana. A partir daqui, com a excepção do Xai-Xai, a paisagem estava intacta de dedo humano (leia-se, betão armado). A beira da estrada estava permanentemente agitada por comércio ambulante, gente para cá e para lá, miúdos a brincar, senhoras que carregam coisas na cabeça, homens a descansar, polícia à cata de multa (ou comissão), galinhas, etc. Os vendedores de caju penduram sacos plásticos brancos nas árvores junto à estrada, para avisar com antecedência os condutores que ali se faz negócio. As pessoas aparecem sem avisar e sem se perceber de onde. Outras desaparecem da mesma forma, investindo para dentro do mato onde às vezes se vislumbram pequenas aldeias nativas. Normalmente descalças, batem os trilhos da berma sem medo aos raios solares nem aos carros que circulam na estrada.







Fizemos a primeira pausa para hidratar passadas duas horas de viagem. Parámos numa esplanada para tirar o gosto a uma Laurentina e esticar um pouco as pernas. Um cartaz dava conta da ausência de seguro (ou insecticida) para eventuais aterragens de emergência, de insectos, nos pratos dos clientes. Talvez por não estar a comer ou pelo calor que ainda se fazia sentir, não passou por ali nem um único mosquito.




Com saltos mas sem sobressaltos continuamos a nossa viagem. A estrada (nacional nº1, construída pelos Portugueses, que desde então conserva o mesmo asfalto) estava cheia de buracos e a tranquilidade da viagem dependia em larga escala da astúcia e reflexos do condutor. O trânsito aumentava dando sinais do fim-de-semana prolongado que se avizinhava. Chapas e machibombos abarrotados de gente, circulavam lentamente e abrandavam o nosso ritmo. Quase todas as carrinhas de caixa aberta traziam gente sentada em cima da carga. Ao ultrapassa-los alguns diziam adeus, outros pareciam demasiado exaustos para levantar a mão, alguns mais novos enfrentavam o vento com as ventas e desfrutavam em jeito canino, outros dormiam, todos com a satisfação do regresso a casa.




Ao passar por Madendere paramos na casa da senhora Podina. Esta paragem havia sido programada pelos meus amigos (Filipa e Pedro) que já conheciam a anciã (solícita senhora que há algum tempo atrás quando passavam por esta pequena aldeia pôs à disposição a sua humilde casa para guardar o carro, que então se havia avariado). Mais uma vez a amável senhora recebeu-nos de braços abertos. Convidou-nos para entrar na sua casa e à luz de vela conduziu-nos até à sua pequena machamba onde havia uma pequena área de lazer. Enquanto conversávamos com os restantes familiares bebemos mais uma Laurentina cada um. Passamos talvez vinte minutos até que o crepúsculo se tornou noite e seguimos viagem.


A noite estava escura como breu e a atenção do condutor foi forçosamente redobrada. Ainda assim, foi possível enxergar as silhuetas das copas dos coqueiros, que eram aos milhares. Estávamos a chegar ao destino.
Fizemos o check-in em casa do Pedro Mosca. Cumprimentamos o senhor João (fiel empregado e segurança da casa) e fomos jantar.

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